Diretor de Shoah, documentário que representou para a história do Holocausto no cinema o que a obra de Primo Levi significou para a literatura, Claude Lanzmann é herdeiro de uma nobre linhagem de intelectuais franceses para quem o pensamento, a ação, a rebeldia e mesmo a sexualidade sempre ocuparam a mesma órbita. Como Sartre e Simone de Beauvoir (de quem foi amante), Lanzmann tem uma trajetória calcada na insatisfação e na busca permanente pela honestidade intelectual. Escrito com punch romanesco, A lebre da Patagônia apresenta um intelectual sui generis: o mesmo sujeito que se diz dado a peripécias (pilotou aviões, escalou montanhas, foi dos poucos ocidentais a conseguir penetrar na Coreia do Norte), em seguida declara candidamente que a coragem e a covardia são os eixos de sua vida. Por isso, são especialmente elucidativos os capítulos sobre o intrincado processo, repleto de aventuras, fracassos e até farsas, de filmagem de seu famoso documentário, obra que consumiu dez anos e que ainda o assombra. Narrativa extraordinária de um percurso inconformista, A lebre da Patagônia é o autoexame profundo (e paradoxalmente muito pouco nostálgico) de um homem que sempre fez questão de habitar o seu próprio tempo.